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Indiferente a uma série de denúncias, processos judiciais e relatos dramáticos de franqueados que perderam tudo, o fundador e CEO da Cacau Show, Alexandre Tadeu da Costa, conhecido como Alê Costa, segue apostando alto em um projeto pessoal. Ele está erguendo, no interior de São Paulo, o Cacau Park — megaempreendimento orçado em R$ 2 bilhões, que promete ser o maior parque de diversões do Brasil.

O parque terá atrações temáticas baseadas na trajetória do próprio empresário e na marca. Os carrinhos de bate-bate, por exemplo, serão réplicas de Fuscas azuis 1988, o primeiro carro que Alê teria usado para vender chocolates. A promessa inclui ainda a montanha-russa mais veloz da América Latina e espaços inteiramente dedicados aos produtos da rede, que hoje conta com mais de 4 mil unidades espalhadas pelo país.
Desde o anúncio do projeto, em 2024, Alê Costa passou a adotar visual inspirado no personagem Willy Wonka, do clássico infantil “A Fantástica Fábrica de Chocolate”, usando cartola, trajes de veludo escuro e bengala. Mas por trás do espetáculo, relatos de funcionários, ex-funcionários e franqueados traçam um cenário de exploração, abusos e medo.

Pressão, jornadas exaustivas e contratos abusivos
Colaboradores diretamente envolvidos na obra relataram rotinas de intensa pressão para acelerar as entregas, muitas vezes em detrimento da qualidade e segurança das instalações. Há ainda denúncias de descumprimento de contratos e violações trabalhistas. O ambiente é descrito como sufocante e tenso.
A realidade enfrentada por parte dos franqueados também é marcada por sofrimento. A coluna ouviu dezenas de relatos, a maioria sob anonimato por medo de represálias. As histórias se repetem: sonho de empreender, promessas de retorno rápido e, em seguida, cobranças, taxas não previstas, aditamentos contratuais e dívidas impagáveis. Em muitos casos, os empresários avalizaram as operações com bens pessoais como casas e carros, e se viram presos em contratos restritivos e prejudiciais.
“É um rastro de gente quebrada”
Irene Angelis, ex-franqueada da rede, conta ter perdido R$ 3 milhões após abrir seis unidades da Cacau Show. “A sensação é que quanto mais franqueado quebra, mais loja ele repassa e ganha em taxas e juros. Virou uma indústria. E ele lucra com tudo. Ficou bilionário deixando um rastro de pessoas quebradas”, desabafa.
Os relatos incluem ex-franqueadas que perderam a saúde física e mental, com casos de síndrome do pânico, depressão e esgotamento. Algumas dizem ter enfrentado situações humilhantes ao tentarem buscar ajuda da franqueadora. “Me disseram que eu precisava me benzer”, relatou uma empresária após pedir apoio para salvar sua operação.
Tragédias e omissão
Nem mesmo a tragédia climática que atingiu o Rio Grande do Sul em 2024 serviu de alívio para franqueados afetados. Uma lojista que perdeu tudo na enchente conta ter sido cobrada pela mercadoria destruída e pelas taxas sobre vendas que não aconteceram. Tentativas de negociar ou rescindir o contrato foram recusadas.
Para escapar da vigilância e do medo de punições, franqueados criaram um perfil anônimo nas redes sociais, chamado “Doce Amargura”, onde relatam abusos e práticas consideradas predatórias. A responsável pela página, que ainda é franqueada, contou ter recebido a visita do vice-presidente da empresa, Túlio Freitas, que teria tentado convencê-la a desistir da denúncia.
Justiça e ambiente de seita
Um trecho de decisão judicial recente classifica as práticas da empresa como revanchistas e inconstitucionais. Segundo o juiz Julio Roberto dos Reis, a conduta da Cacau Show busca “inibir o legítimo direito constitucional de ação dos franqueados”.
Muitos descrevem o ambiente na rede como uma “seita”, onde quem questiona as regras enfrenta perseguições, como a entrega de produtos com validade próxima ou de difícil venda. Há quem relate “momentos devocionais” comandados pelo próprio Alê Costa.
Posicionamento oficial
Em nota, a Cacau Show afirmou que “não reconhece as alegações apresentadas pelo perfil Doce Amargura” e declarou que “preza por relações próximas, transparentes e sempre pautadas pelo diálogo”. A empresa disse ainda que visitas como a do diretor comercial Túlio Freitas são de rotina e visam “fortalecer o relacionamento com os franqueados”.
Enquanto isso, o Cacau Park segue em construção. A promessa é inaugurar, em breve, um mundo de diversão e chocolate, enquanto centenas de ex-franqueados seguem acumulando dívidas, processos e frustrações.