
Um esquema de fraudes judiciais envolvendo advogados e empresas de captação de clientes foi desarticulado pela Polícia Civil do Rio Grande do Sul nesta quinta-feira (7). Entre os investigados está um advogado que, sozinho, ajuizou 581 ações em um único dia e chegou a acumular cerca de 100 mil processos no Tribunal de Justiça do Estado. Ele é considerado hoje um dos cinco maiores litigantes do TJRS.
O profissional é suspeito de uma série de fraudes, incluindo o uso de procurações assinadas em nome de pessoas mortas e a apropriação indevida de valores obtidos por meio de ações judiciais. Em um dos casos apurados, uma assinatura em uma procuração datava de dois meses após o falecimento do suposto outorgante. Em outro, duas procurações emitidas em 2023 estavam em nome de uma pessoa internada em estado vegetativo desde 2022.
A polícia estima que o grupo, que atuava por meio da empresa Pro Consumer, tenha causado prejuízos de até R$ 50 milhões a cofres públicos e vítimas — principalmente idosos, aposentados, servidores públicos, policiais militares e professores estaduais.
Esquema de fraude
As investigações revelam que o grupo operava um sistema sofisticado de fraude judicial, apelidado de “advocacia predatória”. O método envolvia três núcleos distintos:
- Núcleo jurídico: formado por advogados responsáveis por ajuizar e conduzir os processos.
- Núcleo de captação: composto por empresas que abordavam potenciais clientes.
- Núcleo financeiro: integrado por contadores e sócios das empresas, que movimentavam os valores recebidos.
Representantes da empresa Pro Consumer acessavam dados pessoais de beneficiários do INSS, especialmente sobre empréstimos consignados, e os procuravam oferecendo serviços para “revisar cobranças abusivas”. Após convencer os clientes a fornecerem documentos, o grupo os utilizava para abrir ações judiciais sem o pleno conhecimento ou autorização das vítimas.
A seguir, os investigados contratavam novos empréstimos em nome dessas pessoas, sem consentimento. Parte dos valores era depositada nas contas das vítimas, que, acreditando tratar-se de indenizações judiciais, transferiam 30% ao grupo como supostos honorários advocatícios.
A fraude só era descoberta quando as vítimas percebiam descontos indevidos em seus benefícios previdenciários e buscavam explicações junto aos bancos ou à Justiça.
Operação Malis Doctor
A investigação, conduzida pela 2ª Delegacia de Polícia de Porto Alegre, culminou na deflagração da Operação Malis Doctor. A ação mobilizou dezenas de agentes para o cumprimento de mandados judiciais contra os envolvidos, em sua maioria localizados na capital gaúcha.
De acordo com o delegado Vinícius Nahan, responsável pelo caso, foram abertos até agora 15 inquéritos policiais: seis referentes a pessoas físicas, cinco originados de requisições judiciais e quatro a partir de denúncias de instituições financeiras.
Dos 14 investigados, nove são advogados. Eles devem responder por crimes como estelionato, falsidade ideológica, uso de documento falso, patrocínio infiel, fraude processual, falsificação de documento particular e apropriação indébita.
As investigações seguem em andamento, e a Polícia Civil não descarta novos desdobramentos e prisões.