
Conhecida pela rigidez na arrecadação, a atual gestão federal parece abrir uma exceção quando o assunto é a indústria da cerveja. Desde 2016, está desligado o Sicobe — sistema da Receita Federal que monitorava em tempo real a produção de bebidas dentro das fábricas por meio de selos eletrônicos. O desligamento, considerado irregular pelo Tribunal de Contas da União (TCU), é tema de disputas no Supremo Tribunal Federal (STF) e voltou ao centro das discussões políticas neste ano.
Criado para coibir fraudes fiscais e sonegação, o Sicobe poderia evitar, segundo estudo da USP, a perda anual de mais de R$ 10 bilhões em arrecadação. Mesmo assim, setores dentro e fora do governo articulam para que o sistema não seja religado. A indústria defende que o modelo se tornou obsoleto e oneroso.
No último dia 3 de abril, representantes do Sindicato Nacional da Indústria da Cerveja (Sindicerv), da Associação Brasileira das Indústrias de Refrigerantes (Abir) e executivos de Ambev e Heineken estiveram reunidos no Ministério da Fazenda. Segundo fontes, receberam uma sinalização do secretário-executivo da pasta, Dario Durigan, de que “na gestão dele, o Sicobe não volta”. O encontro foi registrado na agenda oficial, mas o campo “objetivos”, no entanto, ficou em branco. Confira:

Enquanto isso, o setor tenta emplacar uma Medida Provisória para enterrar definitivamente o controle. Paralelamente, o STF suspendeu, em abril, decisões do TCU que determinavam a volta do Sicobe. O ministro Cristiano Zanin argumentou que cabe à Receita Federal definir suas obrigações acessórias no campo tributário.
A polêmica também envolve o contrato de operação do sistema, estimado em R$ 1,8 bilhão anuais. Duas multinacionais, a suíça Sicpa — antiga operadora — e a japonesa Dentsu Tracking, disputam o controle. Em meio à disputa, veio à tona um áudio de 2024 em que um lobista da Dentsu acusa a secretária-adjunta da Receita, Adriana Gomes Rêgo, de repassar informações sigilosas ao marido, que atuaria em favor da empresa. Mesmo após a denúncia, Adriana segue no cargo.
A Receita Federal sustenta a inviabilidade financeira do religamento. Em nota, afirmou que o custo anual do Sicobe supera o orçamento de diversos ministérios e que, em 2023, a arrecadação tributária com bebidas foi de R$ 13 bilhões — valor insuficiente para justificar a despesa.
Enquanto isso, a batalha pelo controle fiscal do setor de bebidas segue sendo travada nos bastidores do governo, no STF e nos tribunais de contas.