
O debate sobre a possível retomada do horário de verão no Brasil, a partir de 2025, reacende uma antiga e polêmica discussão: até que ponto essa medida representa uma solução eficaz para o setor elétrico ou apenas um paliativo frente a problemas estruturais mais profundos? A recomendação do Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) aponta para um motivo claro e técnico. O sistema elétrico nacional corre o risco de enfrentar um déficit de potência entre 18h e 21h, justamente quando a produção de energia solar diminui significativamente e o consumo aumenta, com a chegada da noite e o uso intensivo de iluminação e equipamentos elétricos.
Nesse contexto, o adiantamento dos relógios em uma hora teria como objetivo principal fazer com que a população consuma mais energia enquanto o sol ainda está presente, reduzindo, assim, a pressão sobre o sistema nos horários de pico. Segundo o ONS, essa mudança poderia aliviar o sistema em até 2 gigawatts (GW), o que representa uma redução bastante significativa da sobrecarga nesse período crítico. Apesar disso, essa solução nos leva a uma reflexão mais ampla: é suficiente adotar medidas temporárias, como o horário de verão, ou o país precisa investir de maneira mais consistente em soluções estruturais e sustentáveis?
É preciso reconhecer que o horário de verão pode trazer resultados imediatos. Historicamente, ele foi utilizado para economizar energia elétrica, especialmente em períodos em que a matriz energética era mais dependente de fontes térmicas e hidrelétricas. Com a mudança dos hábitos de consumo e o crescimento das energias renováveis, o impacto da medida tem sido cada vez mais debatido. No entanto, a atual recomendação do ONS é baseada em um risco real de sobrecarga no sistema, o que reacende a necessidade de ações emergenciais. Ainda assim, medidas paliativas não substituem a urgência de modernizar a estrutura energética brasileira.
Uma das alternativas mais promissoras está no fortalecimento da geração distribuída, especialmente da energia solar, que tem grande potencial em estados como o Mato Grosso. Porém, essa possibilidade esbarra em diversas restrições técnicas, regulatórias e de infraestrutura. Muitas pequenas usinas de minigeração ainda enfrentam dificuldades para se conectar à rede, o que limita o aproveitamento da energia solar gerada durante o dia e compromete sua capacidade de ajudar a suprir a demanda nos horários de maior consumo. Se fossem feitas reformas que permitissem a melhor integração dessas fontes, o sistema se tornaria mais equilibrado, eficiente e sustentável.
Além disso, é fundamental pensar em políticas públicas que incentivem o uso consciente da energia e a redistribuição da carga de consumo. Isso inclui, por exemplo, a criação de tarifas que estimulem o consumo fora dos horários de pico, investimentos em baterias e sistemas de armazenamento, e a modernização das redes de transmissão e distribuição, que são frequentemente apontadas como gargalos para o pleno funcionamento do sistema. O próprio ONS alerta que o risco de déficit de geração pode se estender até 2029, o que reforça a urgência de ações de médio e longo prazo.
Portanto, embora a volta do horário de verão possa ser válida como uma medida emergencial, ela deve ser acompanhada de uma agenda energética mais ampla, técnica e estratégica. O Brasil precisa superar soluções temporárias e mirar em um sistema energético moderno, seguro e sustentável. É necessário um esforço conjunto entre governo, setor privado e sociedade para garantir que decisões sejam tomadas com base em critérios técnicos, pensando no bem-estar da população e na valorização do profissional do setor elétrico. A hora de mudar não é apenas no relógio, mas na estrutura de todo o sistema.
Eng. eletricista e conselheiro do Crea-MT pela ABEE-MT, Robson Vaz @ robsonlvaz