
Foi sancionada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva a Lei que institui a Política Nacional de Humanização do Luto Materno e Parental, garantindo um atendimento mais sensível e estruturado a famílias que enfrentam a perda de um filho durante a gestação, no parto ou nos primeiros dias de vida. A nova legislação foi publicada no Diário Oficial da União desta segunda-feira (26).
A proposta, de autoria do atual ministro da Saúde, Alexandre Padilha, quando ainda era deputado federal, nasceu do diálogo com mães enlutadas. “Essa política define o que as maternidades precisam oferecer para acolher mães e pais que perdem seus filhos antes ou depois do parto. É um passo histórico”, declarou o ministro.
Além de institucionalizar protocolos de acolhimento humanizado, a lei altera as regras sobre registros públicos, permitindo que natimortos recebam o nome escolhido pelos pais — uma forma simbólica, mas profunda, de reconhecimento da existência e da dor dessa perda. Antes, essas certidões continham apenas informações técnicas, como sexo e local de nascimento.
O que muda na prática:
A nova política determina que unidades de saúde passem a oferecer:
- Apoio psicológico especializado
- Exames para investigar a causa da perda
- Acompanhamento de futuras gestações
- Ambientes reservados para despedidas
- Treinamento das equipes para acolhimento adequado
Hoje, apenas três hospitais no país oferecem esse tipo de atendimento: o Hospital Materno Infantil de Brasília (HMIB), o Hospital Materno de Ribeirão Preto (SP) e a Maternidade de Alta Complexidade do Maranhão (PI).
Dor reconhecida e acolhida
No DF, o ambulatório de luto parental do HMIB é referência nacional desde 2013. O espaço acolhe cerca de 50 famílias por mês com atendimento multidisciplinar, oferecendo suporte emocional e clínico para ajudar mães e pais a lidarem com o trauma da perda.
“Não temos o poder de curar o luto de ninguém, mas podemos caminhar junto”, afirma a psiquiatra Maria Marta Freire, responsável pelo ambulatório. Segundo ela, a ausência de acolhimento adequado pode levar ao desenvolvimento de transtornos mentais graves, como depressão profunda. “O luto perinatal é invisível para a sociedade. Não há sequer uma palavra para definir quem perde um filho.”
Vozes do luto
A conselheira tutelar Elem Andrade, atendida há dois anos no ambulatório, relata como o grupo foi fundamental na sua recuperação. “Naquele momento, eu estava no fundo do poço. Mas com apoio da equipe, comecei a enxergar o mundo com mais amor ao próximo.”
Para Julenir dos Santos, mãe que enfrentou quatro perdas gestacionais, a mudança na lei de registros representa um marco. “Na minha última perda, eu já tinha nome para ela, mas isso não constava na certidão. Agora, outras mães poderão nomear seus filhos e suas histórias.”
Números do luto
Entre 2020 e 2023, o Brasil registrou 172.257 óbitos fetais, sendo 40.840 só na região Sudeste. Em 2024, os dados preliminares indicam 22.919 óbitos fetais e 19.997 neonatais (até 28 dias de vida). O Ministério da Saúde já articula com universidades e instituições parceiras a construção de diretrizes técnicas para ampliar a política de forma participativa e efetiva.